quinta-feira, julho 24, 2014

Conversando a gente se entende

Não sei ao certo em que momento de minha vida fui informado de que a vida é finita. Nós nascemos e, com alguma sorte, crescemos, casamos, temos filhos, vêm os netos, a aposentadoria e a morte.

O fato de termos essa certeza não nos castra o desejo de viver. A maioria dos seres humanos passará o resto de suas vidas tentando ignorar o irremediável. A morte virá como virão os dias após as noites por séculos e séculos.
Essa corrida contra o tempo que empreendemos é, ao final de tudo, uma fuga impossível de um encontro que nos levará daqui para algum lugar além de nossa compreensão, a despeito das religiões nos levarem a crer que existe um lugar melhor do que esse aqui para os que se comportarem bem.
Alguns de nós, em algum ponto dessa linha da vida, nos deparamos com a expectativa de abreviação de nosso tempo aqui na terra. Pode ser uma enfermidade, um câncer, ou uma fatalidade, um assalto. O fato é que nesse momento somos envolvidos por um sentimento de medo. Sofremos pela perda que nossa ausência irá provocar nas vidas das pessoas a quem amamos.
Encarar esse momento é um desafio sem comparação. Quando somos nós os escolhidos para embarcar rumo ao desconhecido, fatalmente caímos em depressão, muitas das vezes contribuindo de forma decisiva para que o mau presságio se concretize. Quando ocorre com um parente ou um amigo, também ficamos reféns da situação, sem saber o que fazer ou como consolar o desafortunado.
Ano passado me descobri com uma necrose no fêmur. Parodiando a música, posso dizer que “meu mundo caiu”. Foi um soco na boca do estômago. Pensei que tinha chegado a minha hora. Com certeza, pensei, faltou alguém para fechar a cota do mês, São Pedro abriu o livro, fechou os olhos e seu dedo indicador parou em cima do meu nome. Fui o escolhido.
Passado o impacto inicial e após consultar outros especialistas, vi que meu caso tinha cura, mas eu iria passar um ano em inatividade. Foram oito meses entre a cama e a cadeira de rodas. A cada revisão da cirurgia uma grande expectativa de ter alta e voltar a andar, mas as radiografias indicavam que eu teria que ficar mais algum tempo sem colocar os pés no chão.
Sem perceber, fui entrando em depressão. Fui deixando de lado as coisas que estava fazendo, passei a bater ponto em frente a televisão e a comer compulsivamente. Vieram as dores de cabeça, pressão alta, dores no peito e um medo intenso do dia seguinte.
No momento mais angustiante desse processo, percebi que tinha que procurar ajuda profissional e o amparo dos amigos. De fato, fui a muitos médicos e eliminei passo a passo cada uma das minhas suspeitas. A dentista disse que não havia nada de errado nos meus dentes e que as dores de cabeça poderiam ser da coluna. A oftalmologista informou que meu grau continuava o mesmo. O cardiologista diagnosticou que eu não tinha pressão alta, portanto deveria parar de tomar remédio. O neurologista disse que não havia nada de errado com meu cérebro e que eu deveria ir a um psiquiatra. Fui, e também passei a fazer análise.
Em pouco tempo fui voltando ao normal. Tomei antidepressivos e calmantes, mas acredito que a ajuda maior que tive para sair do atoleiro em que me encontrava veio das conversas que tive com meus médicos, a analista e com os amigos.
Conversar é bom. Falar sobre tudo que te angustia e ouvir o outro é bem legal. Outra coisa que me fez muito bem foi criar novos objetivos, fazer novos planos, voltar a trabalhar. Sobretudo, o que fez a diferença em mim foi a decisão de resolver todas as pendências que havia acumulado através dos anos e que protelava as decisões em busca de um momento melhor. Não há. Quando temos um problema, é melhor resolvê-lo de uma vez por todas, evitando que fique acumulando poeira no fundo de nossa cabeça.
Então, se você está numa encruzilhada, se tens a expectativa de ir falar com Pedrão antes da hora, se é que alguém sabe qual é a hora de partir, ou se somente está sem vontade de viver, procure alguém para conversar. Tem o ditado que diz: “conversando a gente se entende”. É por aí. Converse, limpe o porão da sua cabeça. Coloque nela coisas novas: um amor, um filho, uma música, um livro, um trabalho. Qualquer coisa que possa vir a te dar prazer de voltar a viver. Se você fizer isso, não garanto que vás sobreviver, mas te asseguro que isso te fará muito bem.