Não sei ao certo em que
momento de minha vida fui informado de que a vida é finita. Nós nascemos e, com
alguma sorte, crescemos, casamos, temos filhos, vêm os netos, a aposentadoria e
a morte.
O fato de termos essa
certeza não nos castra o desejo de viver. A maioria dos seres humanos passará o
resto de suas vidas tentando ignorar o irremediável. A morte virá como virão os
dias após as noites por séculos e séculos.
Essa corrida contra o tempo
que empreendemos é, ao final de tudo, uma fuga impossível de um encontro que
nos levará daqui para algum lugar além de nossa compreensão, a despeito das
religiões nos levarem a crer que existe um lugar melhor do que esse aqui para
os que se comportarem bem.
Alguns de nós, em algum
ponto dessa linha da vida, nos deparamos com a expectativa de abreviação de
nosso tempo aqui na terra. Pode ser uma enfermidade, um câncer, ou uma
fatalidade, um assalto. O fato é que nesse momento somos envolvidos por um
sentimento de medo. Sofremos pela perda que nossa ausência irá provocar nas
vidas das pessoas a quem amamos.
Encarar esse momento é um
desafio sem comparação. Quando somos nós os escolhidos para embarcar rumo ao
desconhecido, fatalmente caímos em depressão, muitas das vezes contribuindo de
forma decisiva para que o mau presságio se concretize. Quando ocorre com um
parente ou um amigo, também ficamos reféns da situação, sem saber o que fazer
ou como consolar o desafortunado.
Ano passado me descobri com
uma necrose no fêmur. Parodiando a música, posso dizer que “meu mundo caiu”.
Foi um soco na boca do estômago. Pensei que tinha chegado a minha hora. Com
certeza, pensei, faltou alguém para fechar a cota do mês, São Pedro abriu o
livro, fechou os olhos e seu dedo indicador parou em cima do meu nome. Fui o
escolhido.
Passado o impacto inicial e
após consultar outros especialistas, vi que meu caso tinha cura, mas eu iria
passar um ano em inatividade. Foram oito meses entre a cama e a cadeira de
rodas. A cada revisão da cirurgia uma grande expectativa de ter alta e voltar a
andar, mas as radiografias indicavam que eu teria que ficar mais algum tempo
sem colocar os pés no chão.
Sem perceber, fui entrando em
depressão. Fui deixando de lado as coisas que estava fazendo, passei a bater
ponto em frente a televisão e a comer compulsivamente. Vieram as dores de
cabeça, pressão alta, dores no peito e um medo intenso do dia seguinte.
No momento mais angustiante
desse processo, percebi que tinha que procurar ajuda profissional e o amparo
dos amigos. De fato, fui a muitos médicos e eliminei passo a passo cada uma das
minhas suspeitas. A dentista disse que não havia nada de errado nos meus dentes
e que as dores de cabeça poderiam ser da coluna. A oftalmologista informou que
meu grau continuava o mesmo. O cardiologista diagnosticou que eu não tinha
pressão alta, portanto deveria parar de tomar remédio. O neurologista disse que
não havia nada de errado com meu cérebro e que eu deveria ir a um psiquiatra.
Fui, e também passei a fazer análise.
Em pouco tempo fui voltando
ao normal. Tomei antidepressivos e calmantes, mas acredito que a ajuda maior
que tive para sair do atoleiro em que me encontrava veio das conversas que tive
com meus médicos, a analista e com os amigos.
Conversar é bom. Falar sobre
tudo que te angustia e ouvir o outro é bem legal. Outra coisa que me fez muito
bem foi criar novos objetivos, fazer novos planos, voltar a trabalhar.
Sobretudo, o que fez a diferença em mim foi a decisão de resolver todas as
pendências que havia acumulado através dos anos e que protelava as decisões em busca
de um momento melhor. Não há. Quando temos um problema, é melhor resolvê-lo de
uma vez por todas, evitando que fique acumulando poeira no fundo de nossa
cabeça.
Então, se você está
numa encruzilhada, se tens a expectativa de ir falar com Pedrão antes da hora,
se é que alguém sabe qual é a hora de partir, ou se somente está sem vontade de
viver, procure alguém para conversar. Tem o ditado que diz: “conversando a
gente se entende”. É por aí. Converse, limpe o porão da sua cabeça. Coloque
nela coisas novas: um amor, um filho, uma música, um livro, um trabalho.
Qualquer coisa que possa vir a te dar prazer de voltar a viver. Se você fizer
isso, não garanto que vás sobreviver, mas te asseguro que isso te fará muito
bem.